Pedro tem os sentidos apurados. O paladar sente o seco do ar, que irrita a garganta apertada. Ele sufoca de penumbra durante o dia e apaga os olhos quando ve o sol. Ele sente o cheiro pela boca. Sente o gosto do amargo doce perfume que passa pelas manhas na sua janela. É pela boca que ele ouve a batida do coração. É na garganta que ele dispara. Pedro não fala e estanca qualquer palavra que fica martelando a noite no travesseiro. Mas as palavras têm gosto na boca de Pedro. Gosto de esquecimento. De memória perdida. De tudo que Pedro disse e não se lembra. E por isso Pedro se sente inteiro, mesmo em pedaços. Porque sem memória, sem passado, Pedro é busca e entrega constante. Busca o gosto do sonho, do impossível, da estrada. O gosto do ar, na janela do carro, fascina. E Pedro segue.
Eu nunca sei se ele volta. Mas quando passa, Pedro me deixa entre a felicidade e a exaustão. Entre o delírio e a verdade. E eu fico aqui, sempre na espera por Pedro, por mim.
Nenhum comentário:
Postar um comentário